23 abril 2009

MC 059 – Noite de cachaça

Noite de cachaça e vapor de gin, seguiu sonâmbulo o som da viola e cheiro a alecrim da nova amiga. Que susto de manhã bem a seu lado um cavalo sorria.

MC 058 – O amolador

O amolador passa na vila anunciando seu ofício, acompanhado pelo latido dos cães e desespero das lavadeiras com suas trouxas à cabeça: “Maldito sejas”

MC 057 - Carta de demissão

Debruçada sobre a carta de demissão, Ana as letras virarem formigas e correrem para o açúcar de seu café. Como tudo é relativo, pensa quase feliz.

MC 056 – Antero

Antero corre pra pegar o trem, casaco no ombro, pasta no braço e cinto na mão. Ouve risadas mas continua até que cai de rosto no chão e calça aos pés.

MC 055 – Balançando na corda

Balançando na ponta da corda, pé descalço, cabelo ao vento, o pintor caia prédio, árvores e passantes. Um pássaro, sobrevoa-o e pinga-o de branco.

MC 054 – Perdido de amores

Perdido de amores Caio pegou a viola e foi cantar à janela da bem amada. Mas ai, a tia solteirona saltou-lhe ao pescoço e até hoje não mais desgrudou.

MC-053 – No galinheiro

No galinheiro o velho galo contava as galinhas a suaves bicadas; o jovem galo saltava-lhes pra cima, quebrava ovos, e assim foi parar à mesa de Natal.

MC 052 - Sobre a cidade adormecida

Sobre a cidade adormecida uma estrela teimosa indicava o Sul. E foi assim que num sonho desnorteado o Infante Dom Henrique anteviu o Brasil.

12 abril 2009

A borboleta

Numa tarde de verão, inesperadamente uma borboleta entrou pela casa dentro deu voltas ás cegas e por fim a luz guiou-a para uma das janelas fechadas. Em vão tentava passar e desesperada debatia-se contra os vidros tentando sair. Ofereci-lhe a mão como ajuda mantendo-me parada e sem tentar tocar-lhe, mas ela estava demasiado assustada, só via a luz, as flores e as árvores tão próximas e inacessíveis. Por fim cansada e sem compreender o obstáculo invisível, parou de asas abertas como se delas viesse a força para transpor o vidro. Aproximá-mo-nos e podemos ver como era linda e delicada: - E sua vida é tão breve... cada minuto é precioso... E começamos a temer por ela. O nosso receio imediato era que ela voltasse para trás voando desesperada e os gatos a apanhassem. O perigo era mesmo o Julião que mantém bem vivo o instinto felino de caçador... Ágil salta, sobe às árvores, apanha os pássaros em pleno vôo. Listrado e de olhar vivo parece arraçado de lince; mas vive em paz com os gatos e o cão da casa e gosta que o chamem pelo nome. (É o meu gato preferido). A estratégia foi a Andréa levar os gatos para fora da sala, eles seguiram a dona que mal teve tempo de fechar a porta, deixando miados e protestos lá fora. Enquanto isso, e continuando de máquina fotográfica em punho, eu esperava ansiosa por sua rápida volta e ajuda. E no silêncio da casa sem ousarmos falar, chegamo-nos ainda mais perto. Então muito lentamente Andréa deslizou as mãos, pelo vidro até quase tocar na borboleta e esperou. E ficou imóvel e paciente aguardando. E foi assim. Como que acordando a borboleta estremeceu e voou para o aconchego daquelas mãos amigas que lhe pareceram confiáveis. Estendeu as patinhas e até parecia que nos olhava de lado. Mas surgiu novo problema: a janela era pesada, de guilhotina, estava fechada e eu queria tirar fotos e só com uma mão era impossível fazer as duas coisas. Por troca de sinais e risos, resolvemos ver até onde iria a confiança da borboleta, a nossa calma e habilidade. Aí trocamos de estratégia e papeis: eu ofereci - lhe a mão que não estava ocupada e, depois de alguma hesitação mas sem pressas a bichinha lá subiu, enquanto a Andréa abria a janela e tentando animá-la soprava levemente imitando carícias de vento.! Passaram-se uns minutos... Parecia que a borboleta estava a tomar fôlego para poder voar. E finalmente a liberdade. Mas na alegria e comoção de termos conseguido devolve-la à natureza nem nos lembramos de tirar fotos dela a voar em direção às árvores. Seguimos-lhe o vôo num silêncio cúmplice e feliz. Era linda e batendo as asas coloridas contra o azul do céu ela foi subindo, sumindo... E agora voltou nesta pequena história...