13 dezembro 2007

MC-044 – Cão na varanda

Na casa em frente mora um cão rabugento. Corre e ladra até se engasgar impotente perante os cachorros que arrastam felizes os seus donos.

MC-043 – Nos céus

Nos céus de São Paulo dois helicópteros pairam sobre a cidade enquanto uma garça, silenciosa e branca, voa veloz arrastando o meu olhar.

MC-042 – O gato

O gato, um olho aberto outro fechado, parecia ausente, Tia Micas estranhando o silêncio na casa correu para a gaiola onde já não havia canário...

MC-041 - Zizi

Zizi, a boneca de minha Mãe, tinha rosto de porcelana, olhos azuis, laços no cabelo em cachos e os braços estendidos numa eterna espera de agrados.

20 outubro 2007

C-001 - DESCOBERTAS DE UM CÃO

Naquela primeira Primavera da vida do nosso cachorrinho, aconteceram-lhe coisas surpreendentes.

Ele tinha apenas três meses quando o meu filho Gustavo o levou para nossa casa, Sentia-se, estranho, friorento e nada mais queria que comida e carinhos.

Se um cachorro pode parecer um pardal assustado acho que era este o caso...

Demorou a explorar a casa e a descobrir a porta para o quintal.

O Inverno terminara, os dias começaram a ficar maiores e mais claros e parecia até que todos tinham vontade de cantar, brincar, desarrumar gavetas e fazer grandes limpezas... Até lhe deram outro caixote maior e uma almofada nova, grande e macia...

Repetiam-lhe tantas vezes a mesma palavra que acabou percebendo ser esse o seu novo nome: Gimbras.

Nessa altura já conseguia descer as escadas sem meter os pés pelas mãos, comer sem entornar o prato e se lambuzar todo e, o que muito lhe custava, ficar sentado esperando o sinal para saltar para o colo do dono.

Mas este momento ainda o deixava algo perplexo: porque seria que esse dono tão querido não se deitava também no chão e em vez disso o obrigava a pular, a pular até por fim se conseguir empoleirar em seus joelhos duros e só depois, e nem sempre, lhe deixava lamber os pêlos da cabeça mas nunca lhe mordiscar nem puxar as orelhas?!

Também já corria á desfilada pelo quintal e brincava de apanhar e trazer a bola.

Sim, agora estava feliz, sentia-se bem, já não tinha frio e a chuva leve e miudinha que por vezes ainda caía até era agradável e fazia sair da terra um aroma especial .

E foi então que se deu a primeira descoberta que o encheu de inquietação :

Uma manhã no tapete de erva verde e cheirosa, em cima de uma perna só, apareceu um ser branco que agitava umas quatro ou cinco asas. O cachorro contou-se a si próprio quatro pernas e uma linda cauda todas pretas e comparou: cinco também.

Mas aquele ser branco que não saía do mesmo lugar e aparecera assim de repente naquela manhã, era muito mais alto que ele e deitava um perfume desconhecido daquela cabeça emplumada.

Durante dois dias Gimbras, ladrou, avançou, recuou, saltou ao redor daquela coisa que lhe continuava delicadamente respondendo com acenos de vento.

A mulher-mãe-do-dono apareceu à janela da casa e gritava toda feliz: "Olha a Primavera ...Chegou ...chegou...Está um magnífico dia...E olha ali um Lírio... tão branquinho!... Está mesmo um dia magnífico ...”

Não sei se todo este barulho acordou o quintal mas logo surgiram da terra mais lírios brancos, logo outros amarelos e ainda outros roxos. O cachorro corria maravilhado de uns para os outros; dando os bons dias e ladrava e saltava-lhes à volta tentando chamá-los para brincar. Até que cansado, parava, olhava, sentava e esperava para de novo recomeçar com as cabriolas.

Por fim tudo voltou à tranquilidade e acabou se habituando àqueles amigos que não sabiam brincar e tinham o tal cheiro tão diferente do seu.

Mas dias depois nova surpresa veio animar sua vida:

Vindos do céu começaram a chegar aos bandos flores e mais flores... umas brancas, outras amarelas, azuis e castanhas, extravagantemente pintalgadas. Não tinham pés nem estavam presas às ervas.

Pareciam coisas loucas. Agitavam os braços-asas, davam voltas, subiam, desciam cheiravam as flores do chão e só não pousaram nele certamente pela protecção do seu casaco de peles e pelos saltos e latidos com que as recebeu.

Vinham cedo com o sol e à tardinha assim que escurecia desapareciam sem se saber para onde.

Por fim começou a achá-las engraçadas e acabaram brincando às escondidas. Mas era difícil ficar quietinho fingindo de morto para depois dar o salto e fazê-las fugir bate-que- bate, azinhas-me-salvem.

Ele ficava a vê-las voar e não podia deixar de sorrir pelo susto que lhes pregara. Agora já sabia que elas se chamavam borboletas. Boas de ver mas não de comer.

A propósito de comer... seus dentes continuavam afiados mas agora eram fortes e os tapetes e as madeiras tomavam novas formas e multiplicavam-se espalhados por todo o quintal.

Este seu lado artístico não foi apreciado pelo seu dono e ainda menos pela Avó Olívia, a senhora mais velha, a que morava do outro lado do muro, Ai! como ela que se fartou de falar, gesticular... Que susto levou quando a viu de vassoura na mão...

Juntaram seus belos trabalhos e meteram tudo num saco:

-- Lixo... só lixo.... que vergonha seu Gimbras!!! “

Outra descoberta surpreendente aconteceu uns tempos depois quando chegou o verão e com ele aquelas claras e longas noites de luar que lhe traziam a vozes e cheiros dos cachorros das redondezas:

Sem saber como, sentiu sair de sua garganta um longo som que parecia vindo do mais fundo de si próprio... subia, descia, vibrava, ondulava !

Experimentou algumas variantes que achou simplesmente belas.

E assim se iniciou naturalmente no canto coral esmerando-se nos solos agudos.

Isto deu-lhe um enorme prazer mas também problemas com pessoas da vizinhança que tentavam berrar mais alto que ele e ainda lhe atiravam água ( daquela de beber... não da de marcar território ). Felizmente a almofada ficava dentro da casota e eles não a conseguiam atingir...

Depois foi a época de correr atrás dos pássaros que vinham debicar a fruta, e a dos gatos que do alto dos muros saltavam para as árvores tentando pegar os pássaros e sem vergonha lhe faziam caretas, miavam e assopravam mas sem chegarem perto de si, com medo de seus dentes e latidos.

Foi então que percebeu mudara de voz.

Mas da primeira vez que rosnou levou um enorme susto. Tão grande que se escondeu de si próprio. Novo rosnado e aí sentiu o focinho arreganhando franzido, caninos de fora.

Que coisa estranha.e medonha... De peito inchado arremeteu contra o desconhecido e por pouco não mordeu a própria cauda...

Maravilhado percebeu que o rosnar, embora mais abafado e menos barulhento que o ladrar tinha um excelente efeito nos gatos, pássaros e até sobre as pessoas.

Também conseguia saltar mais alto, muito alto mesmo.

E finalmente um dia começou a “construir” buracos na terra. Escavar!!!

A sua primeira obra de engenharia foi um túnel para o quintal da vizinha Foi uma grande vitória alargar assim seu território, correr com os gatos e farejar metodicamente este novo espaço até então inacessível.

Está-se mesmo a ver que isto lhe trouxe mais uma vez ralhos, gritos, água e até pedradas...

Mas terrível era o frio que sentia, quando por cima do muro apareciam faiscando, ameaçadores, os olhos de vidro da senhora do pelo encaracolado e branco.

Sim, podia até cheirá-la nos dias em que ela ficava escondida do lado de lá gritando para o lado de cá... Palavras, ai tantas palavras... era uma senhora muito culta, sabia mesmo muitas palavras... (O que seria isso de “besta quadrada ou bad-black-dog?!)

Mas ela não sabia saltar o muro, nem sequer conseguia escavar um caminho até ele!

Com essa certeza e sentindo-se finalmente “dono do pedaço”, meticulosamente lá foi demarcando o quintal, de perninha ao lado e nariz no no ar, enquanto a olhava orgulhoso com seus pequenos e redondos olhinhos cor de mel.

Mais seguro de si e feliz da vida, Gimbras descobriu os prazeres de brincar com a sua almofada “americana”. ( Devo confessar que fui eu que a comprei, .foi irresistível ao imaginar o cão preto deitado na bandeira ...)

Nunca pensei no quanto e como essa resistente almofada se tornaria num brinquedo tão apreciado e querido.

E ele corria, fintava e atirava-a ao ar, corria e voltava, saltava, trepava e cavalgava alegre, tonto, sem ver flores nem couves, até embater nalguma árvore e cansado do novo jogo, adormecer ternamente a ela abraçado.preparando-se para novo, frenético e estimulante exercício.

Pensando agora nisso, acho que foi por essa altura que os nossos vizinhos, debruçados das janelas atentos e carinhosos o começaram a presentear com pedacinhos de carne, ossos com tutano e, ternurentos ainda animavam o Gimbras comentando:

--“Ai que lindinho!...olhem só como é alegre ... e tão engraçadinho !!!”

E assim se passaram os primeiros anos da vida do nosso cachorrinho.

08 agosto 2007

LL-001 - Sons na noite

Três sapos sentaram a coaxar junto à porta de Maria, coaxa que coaxa, ela sem dormir e o marido sem vir.

Três moscas pousaram a zumbir na janela de Maria; zumbe que zumbe, ela sem dormir e o marido sem vir.

Três cegonhas pararam a matraquear na chaminé da casa de Maria; matraqueia que matraqueia, ela sem dormir e o marido sem vir.

Três horas começaram a badalar no relógio da casa de Maria; badala que badala, ela sem dormir e o marido sem vir.

Três gargalhadas por fim soaram junto à cama de Maria; gargalha que gargalha, ela a sorrir e o marido sem dormir.

18 junho 2007

MC-040 - Maldita política

Grumilde adormeceu frente à TV, era campanha eleitoral. Ouvindo palmas e gritos, corre, dá uma bofetada no filho, tropeça no gato e insulta a vizinha

MC-039 - Domingo morno

Antão levantou tarde e dorido naquele domingo morno de Verão. Olhou a barba malsemeada, a meia rota,o cigarro caído na pia... Voltou para a cama

17 junho 2007

MC-038 – Dona Olímpia

Dona Olímpia é tão gorda que transborda das cadeiras no café. Quando viaja compra duas passagens para conforto de sua abundância.

23 abril 2007

Uma tarde burocrática

A velha senhora chegou, de olhar passivamente teimoso.

Sentou-se como se o tempo não mais contasse e esperou.

Era a quinta vez que ali vinha sem nada ser resolvido.

Quando finalmente foi atendida espalhou a papelada, fincou os cotovelos no alto balcão do Banco e declarou que não sairia sem estar o problema solucionado.

O relógio andava, os empregados conversavam e a velhinha sorria e esperava, engolindo a raiva.

O Banco já fechara, nem mais clientes havia.

Por trás dos computadores ouviam-se os teclados e a rodagem das máquinas de contar dinheiro.

O ar condicionado espalhou-se frio e silencioso pela enorme sala, apagando a lembrança do dia suado.

Sem ruído, no placar iam caindo os minutos.

Alguém tossiu no andar de cima.

Então rapidamente tudo foi fácil e, quase sem palavras se fez a transação.

Destrancaram a porta para ela sair

Cinco cabeças dez olhos e um enorme silêncio seguiram a velha senhora que acenou suavemente prometendo voltar em breve...

22 abril 2007

A Borboleta

Este conto é para ti Andréa, minha amiga, filha, nora. É um carinho também para o Eduardo

Numa tarde de verão, inesperadamente uma borboleta entrou pela casa dentro deu voltas ás cegas e por fim a luz guiou-a para uma das janelas fechadas. Em vão tentava passar e desesperada debatia-se contra os vidros tentando sair.

Ofereci-lhe a mão como ajuda mantendo-me parada e sem tentar tocar-lhe, mas ela estava demasiado assustada, só via a luz, as flores e as árvores tão próximas e inacessíveis.

Por fim cansada e sem compreender o obstáculo invisível, parou de asas abertas como se delas viesse a força para transpor o vidro.

Aproximamo-nos e podemos ver como era linda e delicada: - E sua vida é tão breve... cada minuto é precioso...

E começamos a temer por ela.

O nosso receio imediato era que ela voltasse para trás voando desesperada e os gatos a apanhassem. O perigo era mesmo o Julião que mantém bem vivo o instinto felino de caçador... Ágil salta, sobe às árvores, apanha os pássaros em pleno vôo. Listrado e de olhar vivo parece arraçado de lince; mas vive em paz com os gatos e o cão da casa e gosta que o chamem pelo nome. (É o meu gato preferido)

A estratégia foi a Andréa levar os gatos para fora da sala, eles seguiram a dona que mal teve tempo de fechar a porta, deixando miados e protestos lá fora.

Enquanto isso, e continuando de máquina fotográfica em punho, eu esperava ansiosa por sua rápida volta e ajuda. E no silêncio da casa sem ousarmos falar, chegamo-nos ainda mais perto . Então muito lentamente Andréa deslizou as mãos, pelo vidro até quase tocar na borboleta e esperou. E ficou imóvel e paciente aguardando.

E foi assim. Como que acordando a borboleta estremeceu e voou para o aconchego daquelas mãos amigas que lhe pareceram confiáveis. Estendeu as patinhas e até parecia que nos olhava de lado.

Mas surgiu novo problema: a janela era pesada, de guilhotina, estava fechada e eu queria tirar fotos e só com uma mão era impossível fazer as duas coisas.

Por troca de sinais e risos , resolvemos ver até onde iria a confiança da borboleta, a nossa calma e habilidade.

Aí trocamos de estratégia e papeis: eu ofereci - lhe a mão que não estava ocupada e, depois de alguma hesitação mas sem pressas a bichinha lá subiu, enquanto a Andréa abria a janela e tentando animá-la soprava levemente imitando carícias de vento.!

Passaram-se uns minutos ... Parecia que a borboleta estava a tomar fôlego para poder voar.

E finalmente a liberdade.

Mas na alegria e comoção de termos conseguido devolve-la à natureza nem nos lembramos de tirar fotos dela a voar em direção às árvores.

Seguimos-lhe o vôo num silêncio cúmplice e feliz. Era linda e batendo as asas coloridas contra o azul do céu ela foi subindo , sumindo...

E agora voltou nesta pequena história...

18 abril 2007

MC-037 – Paz dos peixes

No seu mundo tranquilo os peixes deslizam nas águas do lago, onde o céu parece também querer mergulhar.

01 abril 2007

MC-036 – Querido Tio

Vó Elvira chegou de boca fina inquisidora. Meu tio não resistiu e foi a correr colocar um disco carnavalesco no gramofone. Ela nunca mais nos visitou

MC-035 – O Toninho

Toninho Cardoso era um menino chato. Vivia de levantar a saia às meninas no recreio. Um dia fizemos uma roda e ele no meio. Voltou em cuecas para casa.

MC-034 – Casamento

Acompanhada do Pai e da marcha nupcial a noiva chega enfim ao altar. Mas alérgica às flores, ela espirra deixando o véu opaco e o noivo a vomitar.

MC-033 – A Maria barbuda

Era uma mulher de braço forte e pegava no trabalho ao nascer do Sol. Tinha duas filhas, loirinhas e o marido mandrião que ficava exausto de a barbear.

31 março 2007

MC-032 – Nascimentos

Zé Cigano espera com os cinco filhos que a mulher acabe de parir. Quando a comadre grita “Gémeos” Zé desvairado tenta meter o último de volta ao útero.

30 março 2007

11 março 2007

MC-030 – Suspiro

MC 030 – Suspiro Tomé afastou a feijoada onde dois ovos o olhavam lembrando a galinha roubada à vizinha que saíra gritando pelada a meio da noite. Belos ovos, suspirou!

MC-029 – Praias e palmeiras

Arranjando as unhas do deputado recém eleito, Betinha sonha com praias e palmeiras enquanto sorri promissora, tentando esquecer a verruga no nariz.

MC-028 – A ambulância

A ambulância corria louca pela cidade gritando passagem. O balão de soro seguiu o ferido porta fora naquela noite de luar.

MC-027 - O colar

Elegante D.Ema rege, batuta em punho, o orfeão da escola. No gesto largo o colar de pérolas solta-se como lágrimas. As alunas festejam a aula acabada.

MC-026 – O mendigo

O mendigo esticou a perna e fez cair D. Amélia sobre o cão que ganindo saltou sobre o pedinte, espalhando o ganho do dia pela rua. Ela seguiu feliz

MC-025 – Fim de luto

Abriu as janelas, retirou os panos que cobriam o espelho, sentou-se ao piano jogando o cabelo para trás e tocou um Alegro ma non tropo.

08 março 2007

MC-024 – Dona Aurélia

Depois de pintar as sobrancelhas ralas, Dona Aurélia traçou na cabeça um risco ao meio e chamou a criada para lhe emprestar as tranças.

MC-023 – Montes e montes

De noite, sozinho na cama, ele sonhava que subia, descia e se perdia entre luxuriantes montes de Montes de Vénus.

MC-022 - A mulher careca

A mulher careca, escolheu a sua mais deslumbrante e loira peruca passou baton e rimel e foi assistir ao velório da amiga.

25 fevereiro 2007

MC-021 – Casa abandonada

Casa abandonada, poucas pessoas a olham de frente, apressam o passo como diante da Velha que nem estende a mão, apenas está, dentro de seu passado.

MC-020 – O pavão

Um sussurro, um bater de asas e sobre o muro surge altivo e belo um pavão. Azul profundo único, brilhante. Oh presença mitológica dos mil olhos...

MC-019 - Lembranças

Já não há amoras bordejando o caminho nem o ranger dos carros de bois, mas nos muros de pedra-solta vestidos de musgo há histórias antigas a murmurar.

MC-018 - Aviso

O céu estava tão azul e havia tanto verde à volta que aquela velha árvore de braços negros erguidos tinha a força de um grito, como se fora um aviso.

MC-017 - Ano a trabalhar

Levaram todo o ano a trabalhar, a juntar dinheiro para umas férias na praia. Por fim chegados, sentaram-se num banco da estrada de costas para o mar

MC-016 - Mal menor

Último dia de aulas, silêncio, paz. Os pássaros sentiram que os gatos não eram assim tão terríveis, não sabiam atirar pedras nem usar fisgas.

MC-015 - Sorriso da Lua

O céu foi passando de azul a vermelho e de cinza a negro. Então surgiu brilhando o sorriso do gato de Alice.

MC-014 - O pardal

O pardal deu três saltos e apanhou a lagarta. O gato abriu a boca e cuspiu o pássaro que sabia a couves.

MC-013 - O Vento

O vento fez a velha cair nos braços dum jovem modelo que se olhava na vitrine. Na autópsia acharam a dentadura dela encravada na garganta dele.

15 fevereiro 2007

MC-012 - O leque

A senhora distinta dobrou-se graciosa apanhando o leque. Um traque sonoro fê la perder a pose...

MC-011 - Compras

Empurrando a custo o carrinho cheio de compras, Dona Eulália posou seus esplêndidos melões sobre a alface francesa e suspirou de alívio.

MC-010 - Aroma de café

O aroma do café obrigou-a a saltar da cama e correr à cozinha. Sobre a mesa duas baratas fornicavam placidamente.

MC-009 - Mau dia

A meio do dia as nuvens cobriam o céu. Sem freguesia, seu José fechou a loja. Em casa nem jantar nem mulher. Então bateu no filho.

MC-008 - De nariz no ar

De nariz no ar, farejando a lebre, Mondego parou e esticou o rabo. Assim faz o cão se bem ensinado.

MC-007 - A nota

Sentado no banco da taberna depois dum dia de trabalho, tio João viu a nota verde caidinha ali no chão. Bendizendo o sapato roto, de mansinho pescou-a.

MC-006 - Ao telefone

Dona Luísa falando ao telefone olhava-se no largo espelho da sala e suas conversas por vezes paravam suspensas no gesto de se alindar.

MC-005 - O jornal

Com o jornal aberto em frente do prato, Dr. Ermelindo construiu um muro de felicidade, não ouvia da esposa os queixumes e podia arrotar.

MC-004 - Celestial

Era noite, era dia, eram estrelas pelo chão, São Pedro sorrindo dormia no colo da Virgem Maria numa nuvem de algodão

MC-003 - Confissão

Fugindo da confissão interrompida Yolanda no meio da nave central anuncia: Ei, moças! Quem quiser saia vermelha vá ao senhor Padre da direita.

MC-002 - Primeira vez

De mãos dadas, chutando pedras pelos caminhos, Paulo e Maria faltaram à escola pelo primeiro de muitos outros dias...

MC-001 - Alentejo

Meio dia, o Sol a prumo comera as sombras e cigarras ocultas gritavam mantras horizontais na planície escaldante. O camponês ergueu o punho para os céus.