25 fevereiro 2007

MC-021 – Casa abandonada

Casa abandonada, poucas pessoas a olham de frente, apressam o passo como diante da Velha que nem estende a mão, apenas está, dentro de seu passado.

MC-020 – O pavão

Um sussurro, um bater de asas e sobre o muro surge altivo e belo um pavão. Azul profundo único, brilhante. Oh presença mitológica dos mil olhos...

MC-019 - Lembranças

Já não há amoras bordejando o caminho nem o ranger dos carros de bois, mas nos muros de pedra-solta vestidos de musgo há histórias antigas a murmurar.

MC-018 - Aviso

O céu estava tão azul e havia tanto verde à volta que aquela velha árvore de braços negros erguidos tinha a força de um grito, como se fora um aviso.

MC-017 - Ano a trabalhar

Levaram todo o ano a trabalhar, a juntar dinheiro para umas férias na praia. Por fim chegados, sentaram-se num banco da estrada de costas para o mar

MC-016 - Mal menor

Último dia de aulas, silêncio, paz. Os pássaros sentiram que os gatos não eram assim tão terríveis, não sabiam atirar pedras nem usar fisgas.

MC-015 - Sorriso da Lua

O céu foi passando de azul a vermelho e de cinza a negro. Então surgiu brilhando o sorriso do gato de Alice.

MC-014 - O pardal

O pardal deu três saltos e apanhou a lagarta. O gato abriu a boca e cuspiu o pássaro que sabia a couves.

MC-013 - O Vento

O vento fez a velha cair nos braços dum jovem modelo que se olhava na vitrine. Na autópsia acharam a dentadura dela encravada na garganta dele.

15 fevereiro 2007

MC-012 - O leque

A senhora distinta dobrou-se graciosa apanhando o leque. Um traque sonoro fê la perder a pose...

MC-011 - Compras

Empurrando a custo o carrinho cheio de compras, Dona Eulália posou seus esplêndidos melões sobre a alface francesa e suspirou de alívio.

MC-010 - Aroma de café

O aroma do café obrigou-a a saltar da cama e correr à cozinha. Sobre a mesa duas baratas fornicavam placidamente.

MC-009 - Mau dia

A meio do dia as nuvens cobriam o céu. Sem freguesia, seu José fechou a loja. Em casa nem jantar nem mulher. Então bateu no filho.

MC-008 - De nariz no ar

De nariz no ar, farejando a lebre, Mondego parou e esticou o rabo. Assim faz o cão se bem ensinado.

MC-007 - A nota

Sentado no banco da taberna depois dum dia de trabalho, tio João viu a nota verde caidinha ali no chão. Bendizendo o sapato roto, de mansinho pescou-a.

MC-006 - Ao telefone

Dona Luísa falando ao telefone olhava-se no largo espelho da sala e suas conversas por vezes paravam suspensas no gesto de se alindar.

MC-005 - O jornal

Com o jornal aberto em frente do prato, Dr. Ermelindo construiu um muro de felicidade, não ouvia da esposa os queixumes e podia arrotar.

MC-004 - Celestial

Era noite, era dia, eram estrelas pelo chão, São Pedro sorrindo dormia no colo da Virgem Maria numa nuvem de algodão

MC-003 - Confissão

Fugindo da confissão interrompida Yolanda no meio da nave central anuncia: Ei, moças! Quem quiser saia vermelha vá ao senhor Padre da direita.

MC-002 - Primeira vez

De mãos dadas, chutando pedras pelos caminhos, Paulo e Maria faltaram à escola pelo primeiro de muitos outros dias...

MC-001 - Alentejo

Meio dia, o Sol a prumo comera as sombras e cigarras ocultas gritavam mantras horizontais na planície escaldante. O camponês ergueu o punho para os céus.